Eram sempre dois, ambos
ali, às onze horas e ninguém via nada, não havia nada além do silêncio ecoando
profundo pelas ruas estreitas e abandonadas, nada além dos dois corpos
aquecidos, nada além dos dois. O tempo os afastava, não, não fazia muito tempo
que não se viam, vinte quatro horas e já era o suficiente, o mesmo horário, o
mesmo lugar. Quase dez anos os faziam distantes, percursos, caminhos, porém
ambos se encontraram. Encontraram-se no profundo silêncio da rua abandonada, um
refúgio no meio do caos urbano, a sala de projeção.
O ritual permenecera o
mesmo por muito tempo, às onze horas, entrada lateral, passos discretos, cada
um chegava por um dos lados do quarteirão. Sempre havia um novo furor, uma
ansiedade desconhecida. Jamais poderiam ser descobertos, jamais alguém poderia
saber de qualquer história. Essa era a história, o caminho de não haver
caminho, o encontro desencontrado, o corpo no corpo; suor, saliva, beijo...
Nada a declarar.
Eis que a noite
estendia pálida seus dedos assombrosos, deslizava ele mais uma vez pela viela
escondida, pairava a mão atrás de um vaso abandonado, caçava a chave; esperava.
Pelo outro lado, passos breves e corridos, silenciosos como felina endoudecida.
Há distância já sentia o perfume, o cheiro que vertia-lhe dos poros, a cadência
da respiração ofegante, amedrontada.
Rapidamente, abriu a
porta, o cheiro do couro velho das antigas poltronas, mistura do velho e o
novo. Rápido enlace, o beijo, volúpia, pupilas dilatando. Ele a empurra contra
a parede, segura firme pelos cabelos. Beija-lhe os lábios, sedento, meticuloso,
astuto. As mãos deslizam pelas costas pequenas de mulher-menina, lhe arrancando
a jaqueta cuidadosamente abotoada, desvendando a blusa fina, rendada. A pele
exala o cheiro do tesão ardente, vibrante. As mãos dela lhe procuram as costas,
as unhas arranham firme, encontram a pele como a navalha encontra a seda.
Respira; respira;
respira. Buscam o ar que lhes falta, o apetite que os consome, enroscam-se as
pernas, deslizam mãos, pele nua, pele fresca cheirando a flores. Com a boca,
ele desbrava um corpo tão conhecido, mas sempre inédito, devora, morde, consome
o cheiro orvalhado da pele morna. Os seios palpitando, os dedos tocando os
lábios que vertem lubricidades. A boca dele, os lábios dela. “chupa com vontade”
e ele afunda o nariz fálico entre as pernas finas, bebe dela cada gota que
escorre.
Vira, toca, beija,
morde, lambe, chupa. A presença nua diante dos olhos, desperta em si o ardor surpreendente,
desejo pelo corpo, pela alma, o seio a palpitar entre os lábios, língua rápida,
corriqueira, desliza pela barriga de encontro ao sexo, outra vez ela o segura
pelos cabelos. Suspiro profundo, para então gemer alto. Segura os braços
delicados, os amarra ao pedestal do antigo projetor com o cinto já tão
conhecido, desliza ágil entre as pernas, o sexo pequeno espera latejando ser
invadido pelo corpo que a toma. Gemidos.
As pernas o puxam com
força. Entra, penetra, invade. Ele o engole em mil abraços, sente cada mínima
parte o apertando, estrangulando, sufocando nas entranhas. As pernas abraçam os
quadris, o corpo se esfregando – arrepios, gritos – entra com força,
pernas-prisões de amantes. Solta as mãos, erguem-se. Apoiada sobre a mesa,
inclina o corpo, segura-a pelo cabelo. Penetra novamente, estocada forte,
firme. Grita.
O corpo pequeno
estendido, desfalecido pelo gozo ardente. Se envolvem em pequenos abraços
rastejantes, caídos, despencam sem forças movidos a suspiros fortes, lado a
lado, o sexo duro ainda a toca as pernas, procura as coxas que o abraçam. Ali,
entre as pernas, verte o gozo quente, mistura-se o líquido dos amores. Ele
lateja entre as coxas, mais uma vez enfia
forte, espera. Coxas molhadas, fluidos, porra. Pernas moles.
Fora a última vez,
findou-se ali o enredo dos dois. Alguns anos depois descobriram os rastros do
amor proibido, os restos do pouco que poderia se saber. Aquela fora a noite do
passamento. Morreram numa versão pornô de Romeu e Julieta, mas não menos
sincera.