Cabana de palha, fica lá na praia
O lugar pra ver o mar chegar
Estrela do céu faz um favor
Mostrar aos olhos
Que
Já estamos no céu...
(Dazaranha: Afinar as Rezas)
Sinto
saudade de um certo aonde. De certos lugares por onde andei, algumas ruas,
algumas praias. Sinto saudade dessa ilha que me criou, fez de mim que eu sou
hoje, sinto saudade dessa terra cujas excentricidades excedem todas as
expectativas, lugar em que a magia faz parte de tudo, proximidade justa entre o
céu e a terra, o melhor de dois mundos.
Sinto
saudade dessa ilha surreal, ilha de encantos, ilha de agrados e desagrados;
sinto saudade de mim mesmo, refletido na água morna num dia ventoso, das dunas
e das lendas.
Saudade material de todo o imaterial construído, não
fiz riqueza, não ganhei a vida, apenas vivi todos os dias permitidos, vivi cada
alegria e cada tristeza daquela terra. Saudade de ti, Conceição e suas estradas
sinuosas, saudade do “vamos fazer um bom dia hoje”. Saudade de quem fui, de
quem me tornei e me perdi depois de atravessar o Mampituba.
Sinto-me
despatriado, exilado no extremo sul do sul, 200 km me separam do Chuí e 800 km
me separam da minha terra: Não, não é minha terra, não nasci lá; mas gostaria.
Cresci na Ilha da Magia, em Nossa Senhora do Desterro. Lá aprendi a ser alguém,
aprendi a ser eu mesmo. Tanto flanei pela Lauro Linhares, quantas vezes chorei minhas
mágoas sentindo teu ar, Desterro. Quantas vezes aportei em tuas terras e me
emocionei por ver a Hercílio Luz iluminada. Vivi para ver neve no pico do
Cambirela, eu lembro bem daquela manhã gelada, o ônibus passando pela Beira Mar
Norte e eu espantado com aquilo. Vivi o apagão geral, 4 dias sem luz, alguém
incendiou os cabos de luz dentro da Colombo Sales, era dia de prova e num
repente tudo estava apagado, quatro dias ouvindo “raidinho” à pilha, jogando
canastra e todo o falatório era sobre o apagão. E, quando arrumaram tudo, veio
a ventania e fez acabar a luz de novo, foram duas horas iluminadas e mais um
dia sem luz.
Vivi
amores, desamores. Chorei e sorri nas tuas terras e teus braços sempre me
aconchegaram, Desterro. Tuas águas embalaram tantas noites, os cigarros à beira
mar, o som das águas chacoalhando o infinito da noite, a vista da ilha das
aranhas. As vezes que me jogava do trapiche de Canasvieiras.
Sim,
eu reclamava: muito da tua beleza foi tirada pela ganância dos homens, muito do
teu esplendor foi apagado por prédios cada vez mais altos a cortar tua bela
paisagem, mas, mesmo assim, és linda, Desterro. Desterro da minha vida.
Eu
lembro bem do meu primeiro dia, descobrindo a nova vida, sendo acolhido pelos
teus braços, envolvido pela tua magia, pensando nas bruxas e todas as loucuras
que um dia tu me deste. Me presenteaste com a vida, a vida nova, com um lar de
verdade. E eu sinto falta do teu ar, sinto falta da tua energia.
Algumas
noite eu acordo, pranteio de saudade, ouço “Daza” e penso no dia do meu
retorno. Dia de olhar novamente tua paisagem e ter um lugar pra chamar de lar,
reclamar do inverno que não faz frio, reclamar das chuvas de outubro/novembro,
reclamar das quatro estações no dia, mas percebo o quanto nada disso importava,
pois era nos teus braços, Desterro, foi nas tuas terras onde criei meu porto
seguro, meu lar desabrigado. Nas tuas praças velei noites a dormir, preocupado
se algo aconteceria comigo, mas eu sabia, eu estava em casa, nada aconteceria.
Mesmo as tristezas, que eram muitas, nada apagou esse amor infinito por ti.
Sinto
saudade deste certo aonde. Aonde vivi, aonde cresci. Lar!