Não me atenho às ideias, minha segurança
está nas palavras, um berço confortável onde me desnudo e me exponho entre o amálgama
sintático das palavras. Tão comum perder-se em si mesmo diante de um mundo
repleto de imperativos e descompassos, o lugar da palavra é confortável e a
fala sempre é uma forma terapêutica. Minhas reflexões não tem um referencial
teórico claro, tampouco específico, mergulho em ideias díspares e tento coloca-las
no papel como se fossem uma coisa só. Perfeito dialogismo que me permite
percorrer todo o tipo de discurso. Claramente, nem sempre conseguiria expor meus
pensamentos de forma clara, não fosse o texto escrito, não fosse esse elemento
tão lúbrico dos dias. Sempre retorno ao desejo, sempre vou ao encontro dele.
Compreendo as medidas complexas impostas
a mim mesmo, por mim mesmo. Não penso no espaço como uma série de interditos;
apenas vejo o sistema ao meu redor tentando o tempo inteiro me enganar de
alguma forma. Por isso a literatura é confortável, por isso ela é mágica, é o
ponto de fuga de uma realidade que, ao ser observada pela janela, é tão repleta
de cinza e tão cheia de asfalto. Há um gosto cinza nesse mundo. Esse nosso
mundo que, de forma tão lúgubre, foi construído com palavras.
Não se engane ao ler minhas
palavras, não padeço da melancolia sistêmica imposta por nosso mundo que
caminha em direção à ruína. Não, não. Apenas sinto no afeto a salvação para o
nosso caos contemporâneo. Ademais, as formas breves sempre me fizeram bem, apenas
despejo sobre essa folha branca a minha maior riqueza, meu verdadeiro capital:
minhas palavras.
As vezes fico tateando os cantos
do meu inconsciente, procurando imagens que façam sentido nesse mundo
contemporâneo, apego-me às sutilezas e às belezas da vida, quero sempre mais,
quero sempre ir ao encontro do plasma, quero o propósito único de não ter propósito
e nem significado, nem quero me prender à agonia do sentido; humildemente confesso
minha grande falha, pois procuro sentido em todos os cantos, todas as horas e
todos os momentos. Mas, a bem da verdade, eu não quero falar nada disso, não é
esse o assunto, mas confesso que me perdi entre as palavras desde a primeira
linha. Gostaria de escrever sobre o desejo, esse era meu projeto inicial;
desejo e amor, amor e desejo. Coisas desse tipo. Queria explicar a beleza desse
retrato que tenho gravado na minha retina, essa imagem que me inspira e torna
os dias mais bonitos.
Sim, essa é uma expressão
romântica, não vou mentir. Padeço do romantismo e sou escravo dele, minhas
ideias simplesmente circulam e a razão fica de lado, escravizado pelo coração
que bate mais forte a cada instante que te vejo, cada segundo faz com que essa
imagem se torne ainda mais nítida, faz-me querer te tocar ainda mais, envolver-te
nos meus braços e apenas esperar o tempo passar, perder-me no tempo é sempre o
mais ambicioso dos sonhos. Dia desses, me peguei imaginando enquanto me perdia
em linhas textuais, linhas sexuais, linhas do corpo, formas e (des)formas
enquanto ouvia ao fundo os teus gemidos e teus suspiros.
Dedos lambuzados, o teu gosto
vertendo pelo corpo e eu desejando cada vez mais. Respiro fundo, sinto-me
liberto. Minha hipótese é breve, pois justamente na tua imagem é que repouso
meu desejo e derramo meu líquido, minhas formas imaginárias em fusão com as
tuas formas imaginárias num êxtase infindável. É, os dias são diferentes e esse
tempo tem sabor de saudade.
Minhas divagações sempre seguem
por lugares estranhos, pois agora te imagino nos meus braços, enquanto fumo meu
cigarro e observo as paredes do quarto; permaneço conjecturando algumas ideias
aleatórias, pois tenho vontade de falar sem parar, mesmo quando eu não consigo.
Esse efeito mimético vislumbrado em um quadro que agora pende na parede, um quadro
nosso, nossos dedos entrelaçados, nossas formas transformadas em óleo sobre a
tela diante dos meus olhos. Sinto cheiro de flores na fumaça dissipada da
imagem.