Fiz e refiz os mais diversos
embalos e sorrisos, criei tantas barreiras que hoje formam um labirinto sem
fim, sem rumo, sem destino, apenas uma entrada e nenhuma saída. Os corredores
todos levam a lugar algum, as paredes sólidas todas iguais, da mesma textura,
todas tão cinza-escuro. E nada se move lá dentro. Apenas mais um lugar dos
tantos. Tantos anos perdido nesse labirinto inconclusivo e banhado de esperança,
não não, nesse lugar não há esperança, alguns dizem que a esperança é verde e
cinza-escuro jamais será verde. Não importa, não mais.
Nem todas as paredes são tão
altas ou lisas que não possam ser atravessadas, mas nem tudo é como um passe de
mágica, as vezes as portas de saída estão apenas escondidas em determinados
espaços, basta apenas um pouco de luz ou algo assim, também não sei ao certo,
os dias são interpelados por tantos mistérios tão alheios à minha capacidade de
compreensão, também não me importo, aliás, mistérios nunca me importaram tanto,
ou importaram, não faz sentido discutir sobre isso. E há tantas coisas por trás
dos olhos, incontáveis e infinitas e ser tragado por eles é uma sensação nova e
surpreendente, diferente, misteriosa.
De repente tudo muda, os rios
mudam de direção, o mar se acalma e as gaivotas somem da objetiva, no mesmo
repente existe tanta paz incapaz de ser descrita. O espelho no final do
corredor muda noutro reflexo tão de mim, no entanto, mais bonito. E na rua, sem
lenço e sem documento, meus passos leves transitam entre a multidão e sinto o
ar gelado me tocando a tez, tudo se dissipa e sigo caminhando. Os cafés se
encheram de vida na vertigem crescente dessa tão constante presença, que de mim
bebe tantas coisas boas.
Em saturno tudo é muito mais
fluido, eu fico absorto ante a presença. O respaldo me empalidece, me
estremece, num repente e tudo parecia tão perdido e vazio, eis a mais poética
de todas as cenas, ali, diante dos meus olhos, aquele quadro que urgia por ser
lido, observado, admirado. O fiz sem temer consequência alguma, uma pintura tão
surrealista como a minha, livre ao vento tragando a vida e baforando a
imensidão de tanto nada quanto eu. Tempos depois senti uma explosão mista entre
napalm bruto, - você sabe, napalm, gasolina com serragem e glicerina, assim que
se faz napalm e eu aprendi com Tyler Durden – e um balão cheio de confeitos. E
tudo ficou doce.
No caminho de volta nem percebi
as paredes, tampouco cinza-escuro. Estranho como saltos temporais são
derradeiras para a fluidez, mas rios não correriam tão belos se em algum
momento não houvessem cachoeiras. Numa dessas eu desci como quem brinca com
água, não me importei com pedras no caminho e nem nada, afinal, a parte de ser
nada, tenho todos os sonhos do mundo e isso basta. Não, não apenas isso, mas
tantas coisas simplesmente bastam, um beijo, um carinho, um abraço, bastam e
depois fica a vontade de querer mais e isso basta. Basta querer mais pro napalm
ter efeito completo, tudo aceso, as velas e tantas outras coisas, uma chama bem
maior, inexplicável, intrínseca ao caminhar pelas calçadas, pela rua, pela
praia. Também basta essa chama e as paredes se desfazem e abrem portas.
Sendo assim, nesse mundo de tão
poucas portas eu abri e deixei entrar, me permiti, permiti a vida ser fluida,
dei espaço a saturo, dei espaço a ela e simplesmente permiti. Apenas a
imensidão do meu pequeno mundo de porta e janela, tão cheio de mim, inundado
por ti. Entre minhas tantas notas e anotações, excertos e abstrações eu procuro
um final adequado para as linhas desse texto, mas não o quero, não vejo o fim;
e isso basta, continuidade é tudo.
Refaço, faço, desfaço, dobro e
desdobro. Continuidade, fluidez mesmo turbulenta. Eu não quero o fim...
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