terça-feira, 30 de setembro de 2014

Fica...



Ele nunca quis machucá-la, é bem verdade. O quarto frio embalava um sono descompassado, agitado e confuso. Ele estava ali ao mesmo tempo em que não estava, havia apenas o nada, a imensidão escurecida, a sombra da ausência escurecida, de olhos borrados, manchados, pintados de água salgada e tinta preta. E a dor? A dor confusa e impiedosa, cruel, torpor fúnebre do desalento inconstante. Restou apenas a dor. Companheira indelével, deturpadora.

“Eu quero que você fique”. Música silenciosa, silêncio ensurdecedor e a presença da ausência. Nunca foi a intenção dele. Insônia, a visita de uma velha amiga desgarrada, perturbadora, cruel; tomaram chá lúgubre durante a noite inteira, estranho, a água era salobra. Bebi da fonte inoculadora de toda dor.

A chuva salpicando o telhado soava como trombetas dissonantes, o turbilhão sinestético se dissipara em apenas uma sensação “você é um lixo”, desse lugar não tem como passar, o fundo do poço nunca fora tão lamacento e obsceno. Em tudo restava apenas o vazio perturbador. Ele pensou em ligar no meio da madrugada, pensou: ela não atenderia. Queria tanto dizer que a ama, gritar esse amor aos quatro cantos. Ela não atenderia. Perdido, estupefato, sem força de manter-se em si.

“Eu quero que você fique” – sibilava baixinho enquanto olhava o teto, falta uma parte e agora é tudo vazio, “volta”, “não desiste de mim”. Devaneios e mais devaneios, a presença impressa pelo quarto inteiro, pelo mundo inteiro; no chão da rua os dizeres ainda estavam escritos quando saiu para encontrá-la, pensou em voltar, queria aquela porção de terra e areia, seguiu em frente. Subiu no trem em direção à ela. O Estômago dava voltas, sentia que a qualquer momento vomitaria um amontoado de nada e fumaça.

“Você está detido.” Perdido em um labirinto kafkiano, apenas isso, o nó no estômago, os olhos procurando qualquer sinal, impossível, não há sentido. Lampejo. Uma vitrola, uma estante para livros, planos, objetivos devidamente anotados em uma caderneta de planejamento; beijo roubado, sublime, o ar preencheu os pulmões, vida. “Fica”, ele pensava.

Fica... Beautiful girl, stay with me....sem o blazer branco.



Fica...

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