domingo, 8 de junho de 2014

Padrinho

Eu herdei um jarro de cachaça cheio de butiás, mas ainda preciso completar com uma boa cachaça, tão licoroso, doce com residual amargo. Posso sentir no palato o gosto suave da bebida e o residual ocre no fundo da língua. Herdei algumas fotos em álbuns de família e ficou um vazio tão estranho. Você partiu e eu fiquei me perguntando o que houve de verdade, não é possível, surreal demais. Mas foi assim e nada tenho mais a fazer, senão lamentar tantos anos sem poder ter te visto.
Me lembro perfeitamente, eu voltei meio bêbado, meio são de uma festa, tomei um drink chamado disco voador e eu precisava chupar um limão, mas tinha sol e eu fiquei com medo. Depois bebi algumas cervejas, meu amigo estava discotecando e lembro de ter tocado alguns funks estranhos e, mais estranho ainda, eu ter dançado tudo aquilo. Era um  sábado comum à guisa da rotina. E eu lembro ter bebido tanto, eram tempos caóticos e completamente deslocados, em poucas horas, foram quase dois maços de cigarro.
Lembro perfeitamente do meu estado embriagado ao chegar em casa, peguei o telefone e reparei em algumas ligações muito incomuns, retornei. Minha avó falava aos prantos do teu mal estar e eu fiquei apavorado. Outras ligações. Meu pânico completo, desespero e fiquei sóbrio instantaneamente.
Movi mundos e fundos e desloquei tantas coisas, tantas coisas na esperança de te ver por uma última vez. Ironia, você era mais novo que meu próprio pai, não poderia acontecer isso, era a sua função ficar no lugar dele caso acontecesse alguma coisa, não era justo e o pânico era imenso. As refeições indigestas, nem o cigarro tinha gosto agradável mais. Tudo estava estranho, desmoronando aos poucos, logo você, forte feito um cavalo de raça, por quê?

Rumo ao terceiro ano sem a tua presença, mesmo que completamente ausente, estranho como você representava tanto e de uma forma completamente incompreensível, invisível, você se foi e o caos reinou, sem ordem e nem nada, apenas tudo caótico. Inclusive a saudade.

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